Seria melhor, simplesmente, transcrever na íntegra a homilia do Papa Francisco, feita hoje na Praça de São Pedro, durante a Vigília de Oração pela Paz. Para isso, porém, basta acessar o site oficial do Vaticano, ou a página da Canção Nova. Não posso, entretanto, deixar de destacar alguns trechos e mencionar certas características do discurso.
Primeira coisa que chamou a minha atenção foi a frequência com a qual o Papa usou o termo "todos". Parece ser algo muito óbvio, mas o Santo Padre deixa a impressão de querer lembrar disso à humanidade e à Igreja, pois, enquanto não se vê todos, é possível criar uma visão fragmentada da humanidade e começar a "classificar" as pessoas.
O Papa Francisco, logo no início, afirma que o nosso mundo, no coração e na mente de Deus, é “casa de harmonia e de paz” e espaço onde todos podem encontrar o seu lugar e sentir-se “em casa”, porque é “isso é bom”. Toda a criação constitui um conjunto harmonioso, bom, mas os seres humanos em particular, criados à imagem e semelhança de Deus, formam uma única família, em que as relações estão marcadas por uma fraternidade real e não simplesmente de palavra: o outro e a outra são o irmão e a irmã que devemos amar, e a relação com Deus, que é amor, fidelidade, bondade, se reflete em todas as relações humanas e dá harmonia para toda a criação. O mundo de Deus é um mundo onde cada um se sente responsável pelo outro, pelo bem do outro.
O que seriam "todas as relações humanas"? Todas mesmo? E antes, o nosso mundo é, realmente, o espaço onde todos podem encontrar o seu lugar? Bem, o Papa diz que assim é o mundo no coração e na mente de Deus. Bem sabemos que no coração e na mente de muitas pessoas, simplesmente não é. Pergunto, como já fiz várias vezes neste blog, será que, pelo menos os católicos, prestam atenção a tudo o que Santo Padre diz? Ou, então, prestam atenção, mas interpretam de seu jeito e "todos", na verdade, são "quase todos". Vi em algum lugar uma charge que mostrava a multidão segurando duas faixas. Em uma estava escrito: "Jesus te ama" e na outra "a não ser que você seja homossexual".
Logo em seguida, fazendo referência à história de Caim e Abel, o Papa continuou: Deus pergunta à consciência do homem: «Onde está o teu irmão Abel?». E Caim responde «Não sei. Acaso sou o guarda do meu irmão?» (Gn 4, 9). Esta pergunta também se dirige a nós, assim que também a nós fará bem perguntar: - Acaso sou o guarda do meu irmão? Sim, tu és o guarda do teu irmão! Ser pessoa significa sermos guardas uns dos outros! Contudo, quando se quebra a harmonia, se produz uma metamorfose: o irmão que devíamos guardar e amar se transforma em adversário a combater, a suprimir. Quanta violência surge a partir deste momento, quantos conflitos, quantas guerras marcaram a nossa história! Basta ver o sofrimento de tantos irmãos e irmãs. Não se trata de algo conjuntural, mas a verdade é esta: em toda violência e em toda guerra fazemos Caim renascer. Todos nós! E ainda hoje prolongamos esta história de confronto entre os irmãos, ainda hoje levantamos a mão contra quem é nosso irmão. Ainda hoje nos deixamos guiar pelos ídolos, pelo egoísmo, pelos nossos interesses; e esta atitude se faz mais aguda: aperfeiçoamos nossas armas, nossa consciência adormeceu, tornamos mais sutis as nossas razões para nos justificar. Como fosse uma coisa normal, continuamos a semear destruição, dor, morte! A violência e a guerra trazem somente morte, falam de morte! A violência e a guerra têm a linguagem da morte!
O Papa Francisco conclui essa parte, dizendo: Depois do Dilúvio, cessou a chuva, surge o arco-íris e a pomba traz um ramo de oliveira.
O movimento GLBTTS, justamente por isso, escolheu o arco-íris como a sua marca. É o sinal da paz e da fraternidade. Pelo menos, da esperança de ambas...
O ponto seguinte foi feito em forma de um diálogo: E neste ponto, me pergunto: É possível percorrer o caminho da paz? Podemos sair desta espiral de dor e de morte? Podemos aprender de novo a caminhar e percorrer o caminho da paz? Invocando a ajuda de Deus, sob o olhar materno da Salus Populi romani, Rainha da paz, quero responder: Sim, é possível para todos! Esta noite queria que de todos os cantos da terra gritássemos: Sim, é possível para todos! E mais ainda, queria que cada um de nós, desde o menor até o maior, inclusive aqueles que estão chamados a governar as nações, respondesse: - Sim queremos! (...) Queria pedir ao Senhor, nesta noite, que nós cristãos e os irmãos de outras religiões, todos os homens e mulheres de boa vontade gritassem com força: a violência e a guerra nunca são o caminho da paz! Que cada um olhe dentro da própria consciência e escute a palavra que diz: sai dos teus interesses que atrofiam o teu coração, supera a indiferença para com o outro que torna o teu coração insensível, vence as tuas razões de morte e abre-te ao diálogo, à reconciliação.
A pregação do Papa Francisco termina com o apelo: Rezemos, nesta noite, pela reconciliação e pela paz, e nos tornemos todos, em todos os ambientes, em homens e mulheres de reconciliação e de paz.
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