A solenidade da Ascensão do Senhor, cronologicamente situada no 40° dia após a ressurreição de Jesus, inscreve-se diretamente na novena de Pentecostes. A sua celebração foi transferida para o domingo, certamente para facilitar aos fiéis a participação em sua liturgia solene. Todos os anos ouvimos aquela pergunta que misteriosos dois homens vestidos de branco fizeram aos apóstolos: Homens da Galiléia, por que ficais aqui, parados, olhando para o céu? (At 1, 10-11). O estilo dessa interrogação lembra-me as palavras de Jesus Ressuscitado no caminho a Emaús (cf. Lc 24, 16. 18). A pergunta não é de alguém que não sabe, mas – mesmo sabendo – quer que a gente fale e, antes de falar, pense. É um convite à – digamos – interiorização. O estilo de vida que levamos hoje, dificulta muito a reflexão. Aí vemos o que acontece quando as pessoas falam e agem sem pensar.
Quando leio aquela pergunta que ouviram os apóstolos no dia da ascensão do Senhor, acabo dividindo-a em duas partes. Invertendo a ordem da frase, penso: por que fico aqui olhando para o céu? É um questionamento que o mundo faz a cada crente (independentemente da religião). Às vezes é, de fato, a solicitação de um esclarecimento e, talvez mais frequentemente, apenas uma crítica. Inclusive, no “mundo gay”, esse tipo de reclamação aparece toda hora. É quando um(a) homossexual diz: “Eu já fui cristão, mas agora sou gay/lésbica” – como se as duas coisas não pudessem coexistir. Aliás, a mesma crítica, vem igualmente do “lado cristão”. Lembro-me, nessas horas, de uma frase do Apóstolo Pedro: estai sempre prontos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que a pedir. (1Pd 3, 14b) Confesso que este é o principal objetivo deste meu blog. Com 15 anos de idade, abracei conscientemente a fé em Cristo. Com aproximadamente 30, admiti e, depois, abracei a minha identidade homossexual. Inicialmente tive a sensação de estar “em cima do muro” e de precisar “pular” para um, ou para outro lado. Depois compreendi que não precisava – e nem devia – “pular” para nenhum dos lados, mas reconciliá-los entre si. Existe ainda, sim, certa tensão, algum resquício de conflito de valores, mas encontro a chave naquilo que é essencial, tanto para o cristianismo, quanto para a homossexualidade (e os demais “tipos” de sexualidade”) – o amor. E para aprender cada vez mais a amar, fico “olhando ao Céu”, evidentemente, não apenas no sentido literal. Neste contexto identifico-me com um trecho do 2° volume de “Jesus de Nazaré”, livro escrito pelo Papa Bento XVI:
(...) os discípulos não se sentem abandonados; não pensam que Jesus tenha como que sumido num Céu inacessível e distante deles. Têm evidentemente a certeza de uma presença nova de Jesus. Estão seguros de que o Ressuscitado (como, segundo Mateus, Ele mesmo dissera) precisamente agora está presente no meio deles de uma maneira nova e com poder. Sabem que “a direita de Deus”, à qual agora Ele é “elevado”, implica um modo novo da sua presença, que não se pode perder mais: precisamente o modo como só Deus pode tornar-se próximo de nós. A alegria dos discípulos, depois da “ascensão”, corrige a imagem que temos desta. A “ascensão” não é partida para uma zona distante do universo, mas a proximidade permanente, que os discípulos sentem tão fortemente, a ponto de que daí lhes vem uma alegria duradoura. (Bento XVI, “Jesus de Nazaré” 2° volume; Editora Planeta do Brasil, São Paulo, 2011; p. 251-252)
Agora, e como que em consequência da primeira parte de pergunta ("por que ficais olhando para o céu?"), vem outra parte: "por que ficais aqui, parados?" Enquanto a pergunta anterior associa-se mais ao “questionamento do mundo” (inclusive, do “mundo gay”), esta parece ser formulada pelo próprio Senhor. E, de novo, ainda que tenha esta forma gramática, a frase deixa de ser pergunta, para tornar-se uma ordem. É como “levanta-te e anda” que os paralíticos e outros doentes ouviam de Jesus. É, também, como a missão que os apóstolos receberam, justamente, no dia da ascensão de Cristo: Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda criatura! (Mc 16, 15). Não posso ficar parado. Anunciar é a dinâmica própria do Evangelho e daquele que o recebeu. E aqui, pouco importa ser homo ou heterossexual. Ai de mim, se eu não anunciar o evangelho! (1Cor 9, 16)
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