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Desde o seu início em 2007, este blog evoluiu
e hoje, quase exclusivamente,
ocupa-se com a reflexão sobre a vida de um homossexual,
no contexto de sua fé católica.



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16 de outubro de 2013

Teresa e a solidão

 
Quem já leu alguns escritos de Santa Teresa d'Ávila (Doutora da Igreja; 1515-1582), por exemplo, "Livro da vida", "Caminho de perfeição", "Castelo interior", ou outros, percebe facilmente a profunda analogia que existe entre as experiências místicas e... eróticas. Afinal, o essencial, em ambas as dimensões, é a experiência de amor. Por mais que alguém se espante com tal comparação, para mim vale a frase do Evangelho de hoje (Lc 11, 37-41): Insensatos! Aquele que fez o exterior não fez também o interior? O mesmo Criador que se revela na infinita riqueza dos fenômenos da alma, manifesta o seu amor em - também infinita - riqueza dos fenômenos do corpo. É claro que trata-se de uma enorme desproporção, pois - como nós, cristãos, acreditamos - a alma é imortal e o corpo (pelo menos em sua forma atual) não é. A desproporção não é, entretanto, uma oposição. Ainda que a Palavra de Deus tenha revelado a rivalidade que existe entre essas duas dimensões do ser humano, a espiritual e a carnal, não há necessidade de demonizar o corpo e, particularmente, a sua experiência sexual, como costumam fazer muitos cristãos.
 
Anselm Grün, monge beneditino e escritor (mais um dos autores, criticados por causa da originalidade de suas ideias), em seu livro "Mística e eros" (Ed. Lyra; Curitiba, 2002), escreve: Eu sei que, a partir da minha história de vida, sempre tenho estado em dificuldades com a minha própria sexualidade, principalmente quando quero padronizá-la ou perco a relação com ela, separando-a, reprimindo-a, ou quando, coisa maximamente preferível, quero elevar-me acima dela. Quando eu a acolho com reconhecimento, como força que me faz sentir vivo, que quer me conduzir para além de mim mesmo, que me faz ser completamente homem, então há instantes nos quais a minha sexualidade se transforma em energia espiritual. Então percebo em mim mesmo uma profunda paz (p. 119).
 
Voltando à Santa Teresa, devo dizer que ao ler os seus textos, sobretudo os autobiográficos, percebo aquela analogia da qual falei acima. Ainda que ela tenha falado de coisas muito mais sublimes e místicas, sinto-me tocado e compreendo, um pouco melhor, as coisas que sinto. Digamos que a "alta mística" de uma Santa Doutora, ajuda a desvendar a "baixa mística" de um homossexual... Vejamos, por exemplo, este texto:
 
Se alguma coisa pudesse dar consolo, seria conversar com quem tivesse passado por esse tormento. (...) É como alguém que está com a corda no pescoço e está sufocando, que procura tomar fôlego. Assim me parece que esse desejo de companhia é nossa fraqueza, pois, como a dor nos põe em perigo de morte, assim o desejo que a alma e o corpo têm de não se separar é o que pede socorro para tomar fôlego. E falando, queixando-se e divertindo-se, busca remédio para viver (Santa Teresa, Livro da vida, Ed. Penguin Classics Companhia das Letras, São Paulo, 2010; p. 183).
 
Ou este trecho, que parece tão familiar para nós, os GLBTT:
 
Era esta visão: vi-me em oração sozinha num campo grande, ao redor de mim pessoas de diferentes tipos me cercavam. Todas, parecia-me, tinham armas nas mãos para ferir-me: umas, lanças; outras, espadas; outras, adagas; e outras, estoques muito grandes. Enfim, eu não podia sair por nenhum lado sem que me pusesse em perigo de morte. E sozinha, sem achar uma pessoa do meu lado. Estando meu espírito nessa aflição, pois não sabia o que fazer de mim, ergui os olhos ao céu e vi Cristo, não no céu, mas acima de mim bem alto no ar. E estendia a mão em minha direção e dali me favorecia de um modo que eu não temia mais todas as outras pessoas, nem elas, ainda que quisessem, podiam me causar dano. (...) falo de amigos e parentes e, o que mais me espanta, pessoas muito boas. Por todos me vi tão pressionada, pensando eles que faziam um bem, que não sabia como me defender nem o que fazer (idem, p. 381-382).
 
Mais um texto. Lindo!
 
Via um anjo junto de mim do lado esquerdo em forma corporal, o que não costumo ver, a não ser por maravilha. (...) Não era grande, mas pequeno, muito bonito, o rosto tão aceso que parecia dos anjos muito elevados que parecem que se abrasam inteiros. (...) Via em suas mãos um dardo de ouro grande e no final da ponta me parecia haver um pouco de fogo. Ele parecia enfiá-lo algumas vezes em meu coração e chagava às entranhas. Ao tirá-lo me parecia que as levava consigo e me deixava toda abrasada em grande amor de Deus. Era tão grande a dor que me fazia dar aqueles gemidos, e tão excessiva suavidade que põe em mim essa enorme dor que não há como desejar que se tire nem se contenta a alma com menos do que Deus. Não é uma dor corporal, mas espiritual, ainda que não deixe o corpo de participar em alguma coisa e até bastante (idem, p. 267-268).
 
 

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