Fonte: deviantART
Como falei recentemente, o rosário faz parte da minha experiência da fé e por isso decidi compartilhar aqui alguns pensamentos, seguindo o esquema proposto pela própria estrutura desta devoção. São os mistérios que nos ajudam a percorrer os momentos fundamentais da história da Salvação, ou melhor, do seu ponto mais alto - afinal, a história da salvação começou com a criação e só vai terminar com o fim dos tempos. Ainda que acreditemos na vida eterna, seria difícil aplicar o termo "história" a uma realidade que, pelo que parece, não se submeterá mais às dimensões (limites?) do tempo e de sua passagem. O conteúdo das meditações do rosário visam o ápice da história da salvação, que São Paulo chamou de "plenitude dos tempos": (...) quando veio a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, que nasceu de uma mulher (Ga 4, 4).
Embora o título mais usado para descrever o momento inicial tenha sido "Anunciação", um pouco de reflexão leva a crer que o essencial no encontro do Anjo com Maria foi o "SIM" dela e, consequentemente, a encarnação do Verbo, isto é, a concepção do Menino no seio de Maria que, curiosamente, o próprio texto bíblico não menciona naquela altura. O que mesmo chama a minha atenção é a série de situações e acontecimentos tão diferentes daquilo que pode ter sido chamado de "padrão", inclusive na própria lei de Deus e nos costumes do povo, baseados naquela mesma lei. E o que dizer da "lei natural"? Se não se tratasse dos desígnios de Deus, o mais adequado seria dizer que tudo deu errado. A gravidez fora do casamento, o casamento sem a transmissão de vida (reprodução), a paternidade "putativa" (olha, não é isso o que o termo sugere!), a "família-modelo" (a Sagrada), tão diferente de todas as famílias anteriores e posteriores... A primeira ideia que vem à cabeça é que Deus, certamente, queria quebrar na mentalidade humana o conceito de "padrão".
O "SIM" de Maria - literalmente: Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra (Lc 1, 38) - foi precedido pela perturbação interior daquela que era a cheia de graça (cf. Lc 1, 28) e bendita entre as mulheres (cf. Lc 1, 48), pela incapacidade de entender e pela pergunta "como?" que, sem dúvida, contém o "por que?" (talvez, até: "por que eu?") e tantas outras interrogações. Mais uma ideia: Deus admite a nossa limitação e acolhe as nossas perguntas, ainda que quisesse deixa-las sem resposta suficientemente esclarecedora.
Por mais que me sinta distante da santidade, pureza e glória de Maria Santíssima, entro aqui com a minha analogia. Como um homossexual, vejo a parte essencial da minha realidade como aquela que não se encaixa nos "padrões" descritos pela lei natural, lei de Deus (pelo menos essa que me foi transmitida pela Igreja) e pelos costumes vigentes. Faço aqui uma observação: será que agindo exatamente desta forma incomum, o próprio Deus não quer ampliar o nosso entendimento de sua lei?
Quantas vezes brotaram no meu coração as mais existenciais perguntas, tais como: "Por que?", "Por que eu?", "Com viver?", "Como amar?". Por que seria uma blasfêmia, ou, ao menos, uma ousadia, considerar Maria como alguém que o próprio Deus colocou bem ao meu lado? Será um abuso pensar que Maria diz a cada um de nós: "Eu te compreendo"?
Deixo essas ideias aqui e vou me entregar à oração serena e confiante...
Outra meditação sobre a Anunciação está aqui.
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