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Desde o seu início em 2007, este blog evoluiu
e hoje, quase exclusivamente,
ocupa-se com a reflexão sobre a vida de um homossexual,
no contexto de sua fé católica.



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22 de março de 2011

pais, mestres e guias

O Evangelho de hoje (Mt 23, 1-12) traz duras criticas de Jesus dirigidas à elite religiosa de Israel. Logo podemos dizer que o cristianismo é o herdeiro do Povo de Israel não só em coisas boas, pois as mesmas críticas aplicam-se perfeitamente em relação à Igreja. Imagino como fica difícil para um sacerdote (consciente) ler e comentar este texto. Ainda bem que temos muitos padres que não se esquecem de que a própria orelha fica mais perto da boca que fala. Não faltam, entretanto, aqueles que falam e não praticam, amarram pesados fardos e os colocam nos ombros dos outros, mas eles mesmos não estão dispostos a movê-los, nem sequer com um dedo (vv. 3-4), gostam de lugar de honra nos banquetes e dos primeiros lugares (...), de ser cumprimentados nas praças públicas e de serem chamados de mestre (vv. 6-7). Por isso, devemos fazer e observar tudo o que eles dizem, mas não imitar suas ações (cf. v. 3). Compreendo estas advertências de Jesus não como incentivo ao anticlericalismo ou à contestação da Igreja como tal. A questão é de estarmos sempre atentos e cultivarmos a humildade. A crítica deve ser objetiva e construtiva. Ja falei neste blog sobre a razão pela qual não abandono a Igreja (aqui). Imagino uma pessoa que usa, por necessidade, a cadeira de rodas. Se perguntarmos: "Você acha essa cadeira boa e bonita?", a resposta, certamente, seria: "Não se trata de ser boa ou bonita. Ela até pode me incomodar, assim como incomoda os outros, mas neste momento necessito dela para chegar aonde preciso. Por ser útil, torna-se boa e até bonita". É, evidentemente, apenas uma comparação, talvez simples demais, mas algo assim ocorre na minha compreensão da Igreja como instrumento útil para chegar a Deus e o instrumento que Ele próprio quis chamar à existência. As falhas da Igreja provém da fragilidade humana e não são de autoria do seu Fundador. É também por isso que a liturgia não omite uma passagem do Evangelho como essa.
A segunda parte do texto pode gerar algumas dificuldades. O que foi que Jesus quis dizer com essas palavras: Na terra, não chameis a ninguém de pai, pois um só é vosso Pai, aquele que está nos céus. (v. 9)? Disse também que devemos evitar os títulos como "mestre" ou "guia" (cf. vv. 8. 10). No contexto das censuras anteriores, fica claro que o Senhor ensina a combater a tentação de falsa grandeza ou importância pessoal, "representada" para o olhar dos outros (coisas que os religiosos da época adoravam). Mas como fica a questão de não chamar ninguém, aqui na terra, de pai? Os irmãos protestantes apontam, como uma das formas de "infidelidade católica" perante a Sagrada Escritura, a existência e as funções do Papa e dos padres (cujos títulos provêm da palavra "pai"). A Igreja, aliás, utiliza também, os títulos de mestre (p.ex. nos noviciados) e de guia (espiritual). Pessoalmente, compreendo todas essas "proibições" de Jesus, exatamente, como advertências. Ele conhece o nosso coração e sabe como é fácil cairmos em algum tipo de exagero ou usurpação de poder e autoridade, como uma espécie de propriedade nossa. Para mim, a palavra-chave é a "participação" (aqui está também o argumento contra as críticas protestantes sobre a intercessão dos santos). Vou tentar explicar... A Bíbli diz que Jesus é o Fílho único de Deus (cf. Jo 1,14; 1Jo 4, 9, etc.), mas também, que nós somos filhos de Deus (cf. Rm 8, 16; 1Jo 3, 1, etc.). Não é contradição, pois somos filhos de Deus, porque fomos admititos pela graça à única filhação divina de Cristo. Com outras palavras: somos filhos de Deus em Cristo. A Bíblia diz que Cristo é o único mediador entre homens e Deus (cf. 1Tm 2,5). Da mesma maneira, Ele nos concedeu a graça de participarmos nesta mediação e sermos, também, mediadores ou intercessores (na terra e, depois de partirmos daqui, ainda mais). Creio que haja a mesma lógica em questão da paternidade, em todas as suas expressões, começando pela biológica. O Apóstolo Paulo diz: Dobro os joelhos diante do Pai, de quem recebe o nome toda paternidade no céu e na terra (Ef 3, 14) e, em outro lugar, reivindica o direito de paternidade espiritual, escrevendo aos seus "filhos": De fato, mesmo que tenhais milhares de educadores em Cristo, não tendes muitos pais. Pois fui eu que, pelo anúncio do evangelho, vos gerei no Cristo Jesus (1Cor 4, 15). Paulo não contradiz as palavras de Cristo. Ele as compreende e interpreta. Não se trata, então, de não usar as palavras "pai", "mestre" ou "guia" em relação aos homens, mas de - ao usá-las - não se esquecer de sua origem.
Dito isso tudo, quero acrescentar aqui o meu voto em favor do reconhecimento - em todas as dimensões da sociedade - de direito dos casais homossexuais à adoção dos filhos. A paternidade (assim como a maternidade) que recebe de Deus Pai o seu nome, revela-se - além de sua forma biológica - de muitas outras maneiras, não menos importantes e válidas.

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