ESTE BLOG NÃO POSSUI CONTEÚDO PORNOGRÁFICO

Desde o seu início em 2007, este blog evoluiu
e hoje, quase exclusivamente,
ocupa-se com a reflexão sobre a vida de um homossexual,
no contexto de sua fé católica.



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26 de janeiro de 2011

Reflexões sobre a "Carta" [2]

Depois de uma pequena pausa, estou retornando à leitura da "Carta sobre o atendimento pastoral das pessoas homossexuais". O documento foi assinado pelo então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, cardeal Ratzinger (hoje o Papa Bento XVI), em 01 de outubro de 1986. Como todos os textos deste tipo, a "Carta" possui, também, uma observação final: "O Sumo Pontífice João Paulo II, no decurso da Audiência concedida ao Prefeito abaixo-assinado, aprovou e ordenou a publicação da presente Carta, decidida em reunião ordinária desta Congregação." O texto completo encontra-se aqui e a minha primeira reflexão, aqui. Francamente falando, logo depois daquela primeira postagem, fiquei bastante desanimado, mas como fui eu mesmo quem abraçou o desafio, vai aqui a segunda reflexão...
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Pessoalmente, acho louvável a própria iniciativa da Igreja de se ocupar com as pessoas homossexuais. É claro que a questão seguinte é: como fazer isso. Confesso que li a "Carta" diversas vezes e não encontrei uma resposta clara. O que sobressai (para mim, de uma maneira bastante irritante) é a cautela, para não dizer o medo. É uma preocupação impregnada ao longo do texto inteiro. Como se a Igreja falasse aos bispos e padres que, por acaso, quisessem se aventurar em tal atividade: "Tudo bem, vocês tem a nossa autorização, mas saibam que, certamente, vão se queimar! Por isso, pensem bem, antes de começar esse negócio!". Outra coisa (voltando agora à sequência da leitura) é a referência à ciência: Naturalmente, não se pretende elaborar neste texto um tratado exaustivo sobre um problema tão complexo. Prefere-se concentrar a atenção no contexto específico da perspectiva moral católica. Esta encontra apoio também nos resultados seguros das ciências humanas, as quais, também, possuem objeto e método que lhes são próprios e gozam de legítima autonomia. (n.2) Em seguida, acrescenta-se: a Igreja está em condições não somente de poder aprender das descobertas científicas, mas também de transcender-lhes o horizonte; ela tem a certeza de que a sua visão mais completa respeita a complexa realidade da pessoa humana que, nas suas dimensões espiritual e corpórea, foi criada por Deus e, por sua graça, é chamada a ser herdeira da vida eterna. (idem) Foi sobre isso que escrevi, anteriormente, algumas coisas e, também, argumentei numa conversa com o blogueiro Maicon (veja aqui, especialmente: os comentários). Eu acredito na importância da ciência nesta questão toda, pois é dela que surgem argumentos para o diálogo. Entretanto, o texto da "Carta", mesmo tendo dito sobre o "fenômeno do homossexualismo" (a expressão que pode sugerir um "olhar científico), surpreende depois com a seguinte afirmação: Alguns afirmam que a tendência homossexual, em certos casos, não é fruto de uma opção deliberada e que a pessoa homossexual não tem outra alternativa, sendo obrigada a se comportar de modo homossexual. Por conseguinte, afirma-se que, em tais casos, ela agiria sem culpa, não sendo realmente livre. A minha reação imediata para tal opinião não pode ser citada aqui literalmente, pois lembra bastante os gritos de torcedores numa partida de futebol. Será que é assim que a Igreja "transcende o horizonte da ciência", quer dizer, ignora totalmente as conclusões de suas pesquisas sérias e multidisciplinares? O termo "certos casos" induz à compreensão que seriam poucos estes casos. Onde está o resto desses casos, ou seja, aqueles que se tornaram "deliberadamente" gays e lésbicas? Que tipo de ser humano escolhe o que sentir? Quem é capaz de escolher a vida marcada pela constante discriminação e perseguição, privando-se de uma "felicidade normal" (abençoada pela Igreja-instituição), com o casamento, família e filhos, além de toda garantia de sucesso social e profissional? São, exatamente, estas frazes que põem em dúvida o documento inteiro, embora contenha certo incentivo à criação da Pastoral específica para homossexuais. Já escrevi, na reflexão anterior, que algum alívio em relação a contradições deste documento, é a evolução de pensamento da Igreja como tal. Ainda que esta evolução seja terrivelmente lenta, pelo menos a esperança não morre, por assim dizer. Para provar isso, cito algumas frases do Catecismo da Igreja Católica (de 1992): A homossexualidade se reveste de formas muito variáveis ao longo dos séculos e das culturas. Sua gênese psíquisa continua amplamente inexplicada. (...) Um número não negligenciável de homens e de mulheres apresenta tendências homossexuais profundamente enraizadas. Esta inclinação objetivamente desordenada constitui, para a maioria, uma provação. (CIC, 2357 e 2358). É muito interessante que, desta vez, não se fala de uma "opção". Talvez a lógica, finalmente, tenha funcionado...

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