O título faz alusão ao texto do Livro de Tobias: Porque vós não vos comprazeis em nossa perda: após a tempestade, mandais a bonança; depois das lágrimas e dos gemidos, derramais a alegria (Tb 3, 22). Preciso acrescentar aqui que a frase acima localizei apenas na Bíblia "Ave Maria" e constatei a ausência desta e de várias outras frases nas demais edições da Bíblia (CNBB, Jerusalém etc.), além de não encontrar - evidentemente - o próprio Livro de Tobias nas edições não-católicas. Não é este, entretanto, o assunto de hoje. Seja qual for a fonte dessa intuição sobre os fenômenos da natureza (transferidos de certa forma à convivência humana), parece óbvio que depois de algum tempo de agitação, venha um pouco de paz. É assim que tudo funciona, desde os microscópicos organismos, até às galáxias mais distantes. Ou melhor, desde o palpitar do nosso coração, através da respiração, até ao sexo, tudo tem que ter o ritmo, tem que ser um ciclo, uma onda, com altos e baixos. Nós temos isso no sangue. Está gravado na nossa natureza. É muito provável que seja por isso que sentimos, intuímos, as pulsações da terra, do mar e do ar. E da história, por que não? Sabemos que após a tempestade vem a bonança. Ou, pelo menos, deveria vir.
Desde a última sexta-feira vivemos uma espécie de tempestade, causada pelo "beijo gay" que tenha sido exibido no último capítulo da telenovela da Globo, o "Amor à vida". Estou falando, principalmente, sobre a tempestade que explodiu no microcosmo (ou, talvez, macro-), chamado pomposamente de "redes sociais" que, como todo mundo sabe, se concentram sobretudo no facebook. Temos, é claro, os reflexos no twitter, nos blog's e nos portais que representam este ou aquele lado do palco ideológico-doutrinal da comunicação social. Muitos comemoraram. Muitos se lamentaram. Não tive a menor vontade de calcular as proporções...
Juro que não vou reproduzir aqui, nem em parte, aquelas grandiosas batalhas cibernéticas ou os tratados teológico-pedagógico-jurídicas, contra ou a favor do beijo gay em si, ou da novela, ou da própria Rede Globo em geral. Já escrevi, já fui criticado, já excluí gente da minha lista de contatos, enfim... A tempestade está dando a impressão de querer ir embora, ainda que com alguns trovões e relâmpagos em forma de um "até logo!". O sossego vai durar até a próxima oportunidade. Exatamente assim, como acontece na própria natureza. Digamos, em nosso contexto (LGBT), tivemos a tempestade do Bolsonaro, mais tarde aquela do Feliciano e agora essa do casal Félix e Niko. Os meteorólogos também dão nomes aos tufões e ciclones. Nada original...
O que me trouxe aqui é a pergunta: será que depois de uma tempestade, realmente vem a bonança?
As redes sociais têm a sua dinâmica própria que em parte demonstra a evolução da mentalidade humana. Tirando uma margem que a tela de um computador proporciona, isto é, aquela diferença entre as coisas que se tem a coragem de escrever, mas nunca se diria na cara do outro, em sua grande parte, a discussão tão acalorada como essa, mostrou o crescimento vertiginoso de posicionamentos radicais. O que mais chamou a minha atenção foi o fato de observar isso principalmente entre os jovens. Eu sei que a juventude é radical (OK, digamos: idealista) por natureza e que a moderação (no bom e no mau sentido) ocorre com o tempo, através de choques com a realidade, de decepções, de cansaço e de comodismo, bem como através de estudo e de um amadurecimento em geral.
A humanidade apresenta a mesma dinâmica de forma ainda mais clara. É uma interminável conquista, é a descoberta, é o avanço constante. Sem dúvida, como em cada caminhada, houve tropeços, capazes até de travar por algum tempo o natural progresso da civilização. Tais tropeços tornaram-se, no entanto, uma fonte de sabedoria e enriqueceram a consciência coletiva do gênero humano, passando de uma geração para outra. E é, justamente, neste fluxo de gerações que a gente deposita a expectativa dos tempos melhores. Repete-se, de certa forma, a experiência do povo de Israel que, no final de sua longa peregrinação rumo à terra prometida, constatou que era preciso que morresse aquela geração e surgisse a outra, para obter a vitória definitiva (cf. Jos 5, 6-7). É tão natural a suposição - quase automática - de que cada nova geração supere em suas qualidades a geração anterior.
A impressão que tenho, após a leitura das berrantes declarações homofóbicas daqueles que representam a Igreja Católica Apostólica Furiosa, é que as coisas irão piorar. Essas pessoas, ainda que confusas em sua argumentação e apresentando as falhas graves na compreensão e no uso da língua portuguesa, estão profundamente convencidas quanto à razão exclusiva e absoluta daqueles princípios que nós tão bem conhecemos e que tanto mal já nos fizeram. É como a "Fúria Jovem" da torcida de um clube esportivo. Pior... É como a "Juventude Hitlerista" (Hitlerjugend). Esta analogia pode parecer drástica demais, porém, trata-se de uma lógica semelhante: ainda que por motivos diferentes, o braço jovem de cada uma dessas instituições conhece bem o atalho que reduz ao mínimo a distância entre a ideia e o ato. A crueldade das declarações verbais anuncia uma nova, maior onda da homofobia, com a base no cego fundamentalismo cristão. Lamentavelmente...
"Igreja Católica Apostólica Furiosa": AMEI hahahahaha
ResponderExcluirMas, sério, agora: você viu o relato postado pelo Sergio Viula no blog dele (http://www.foradoarmario.net/2014/02/denuncia-gangues-de-adolescentes-atacam.html)? É uma "Juventude Hitlerista" dessas, garotos de classe média, da Zona Sul do Rio de Janeiro (não dos rincões da periferia), arvorando-se de justiceiros e atacando gays, "cracudos" e, suponho eu, o rapaz que foi preso pelo pescoço a um poste (pelourinho?), com uma tranca de bicicleta... :-( Muito, muito assustador.
ResponderExcluirVi, sim, Cris! É triste e assustador. Lamentavelmente, torna-se cada vez mais cruel e mais frequente.
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