ESTE BLOG NÃO POSSUI CONTEÚDO PORNOGRÁFICO

Desde o seu início em 2007, este blog evoluiu
e hoje, quase exclusivamente,
ocupa-se com a reflexão sobre a vida de um homossexual,
no contexto de sua fé católica.



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27 de julho de 2013

Conversa com o Fulano

Fulano: É verdade que você participou de um encontro de gays?
Eu: Verdade! Foi o 1º Encontro de Relatos e Experiências “O jovem homossexual na Igreja”, promovido pelo Grupo “Diversidade Católica”, no contexto da JMJ Rio2013. Foi ótimo, por sinal!
Fulano: Hm, sei, encontro de gays. Então, qual é a sua opção sexual?
Eu: A minha opção sexual? No momento, é o celibato, quer dizer, não estou com ninguém...
Fulano: Ah, você sabe do que estou falando! Qual é a sua opção na cama?
Eu: Opção na cama? Geralmente adormeço de lado. Esquerdo...
Fulano: Você não entende! Estou perguntando se você é homem, ou mulher!
Eu: Vi uma reportagem sobre o censo realizado, há um tempo, na Rússia. Filmaram uma jovem agente que foi entrevistar o presidente Putin. Ela simplesmente leu as perguntas e a primeira foi: qual é o seu sexo. É homem, ou mulher? A matéria dizia que aquela jovem só não foi presa porque o presidente achou muito engraçado tudo isso. Ora, sou homem, quer ver a prova?
Fulano: Que isso? Que prova?
Eu: Olha, eu faço barba, tenho a voz grossa e tenho também outras coisas que só o homem tem. Você não lê a Bíblia? Deus fez o homem e a mulher. Bem, em grande parte são homens e mulheres heterossexuais. Mas alguns não são...
Fulano: Você quer dizer, são homossexuais e lésbicas?
Eu: Não. As lésbicas também são homossexuais. O termo vem da antiga língua grega. “Homos” quer dizer “igual” e “sexus” é o sexo. As pessoas homossexuais sentem atração física, emocional, estética, afetiva, em relação aos indivíduos do mesmo sexo. E isso acontece tanto entre homens, quanto entre as mulheres.
Fulano: Ah, é? Não sabia... Então, é isso que eu estou perguntando, desde o início.
Eu: Você quer saber, então, qual é a minha orientação sexual? Ou, melhor, a minha identidade sexual?
Fulano: Opção, orientação, identidade... Tudo mesma coisa!
Eu: Não é! De acordo com o Aurélio, opção é a faculdade, o direito, ou a ação de optar, escolher entre duas, ou várias coisas. Eu li, recentemente, um discurso do Papa Bento XVI que critica uma “filosofia da sexualidade, sob o vocábulo «gender - gênero». Ele diz: “De acordo com tal filosofia, o sexo já não é um dado originário da natureza que o homem deve aceitar e preencher pessoalmente de significado, mas uma função social que cada qual decide autonomamente, enquanto até agora era a sociedade quem a decidia. (...) O homem contesta o fato de possuir uma natureza pré-constituída pela sua corporeidade, que caracteriza o ser humano. Nega a sua própria natureza, decidindo que esta não lhe é dada como um fato pré-constituído, mas é ele próprio quem a cria”. E prossegue: “Onde a liberdade do fazer se torna liberdade de fazer-se por si mesmo, chega-se necessariamente a negar o próprio Criador; e, consequentemente, o próprio homem como criatura de Deus, como imagem de Deus, é degradado na essência do seu ser”. Logo, não existe tal de “opção sexual”. Eu usaria o termo “orientação”, mas não no sentido de que eu teria me orientado. Não sou eu que orienta a sexualidade. É ela que me orienta, fazendo com que eu me volte para uma, ou outra direção. E quanto à identidade, em certo sentido, é quando eu me identifico com a minha sexualidade. Para muita gente é um processo longo e, muitas vezes, bastante difícil e doloroso. Com bastante frequência as pessoas dizem de um ato de “assumir” a (homo)sexualidade, seja perante si mesmo, seja diante dos outros. E quando eu fizer essa opção de me assumir perante as pessoas, aí sim, você vai saber, se eu sou gay, ou não. Pois, é isso que você quer saber, não é?
Fulano: Quer dizer, há possibilidade de você virar gay?
Eu: Sim, existe essa possibilidade. Só precisaria de ser um gay, no máximo, do meu tamanho, porque se for maior, eu poderia não conseguir virar.
Fulano: Hã?
Eu: E também depende da posição em que ele estaria. Se estiver deitado, é sempre mais fácil virar um magrinho, do que um do tipo Jô Soares, já imaginou? Agora, em pé...
Fulano: Poxa, é tão difícil conversar com você!
Eu: Você acha difícil? Vou citar, de novo, o Papa Bento XVI: “o primeiro obstáculo que encontramos é um problema de linguagem”... É da Encíclica “Deus caritas est”...

A cultura do encontro

Escuto as palavras do Papa Francisco nesta manhã de sábado, penúltimo dia de sua visita ao Brasil. Vem à minha mente um ditado, repetido, na época, por alguns jornais europeus, em relação ao Papa João Paulo II: “Gostamos do cantor, mas não escutamos as suas canções”. Será que o mesmo acontecerá com Francisco? Existem várias maneiras de atingir o profeta: “Vinde, disseram então, e tramemos uma conspiração contra Jeremias! Por falta de um sacerdote não perecerá a lei, nem pela falta de um sábio, o conselho, ou pela falta de um profeta, a palavra divina. Vinde e firamo-lo com a língua, não lhe demos ouvidos às palavras (Jer 18 , 18).

Aos bispos, sacerdotes e outros religiosos, reunidos hoje pela manhã na Catedral do Rio, o Papa disse, entre outras coisas (na íntegra aqui):

Não podemos ficar encerrados na paróquia, nas nossas comunidades, quando há tanta gente esperando o Evangelho! Não se trata simplesmente de abrir a porta para acolher, mas de sair pela porta fora para procurar e encontrar. Decididamente pensemos a pastoral a partir da periferia, daqueles que estão mais afastados, daqueles que habitualmente não freqüentam a paróquia. Também eles são convidados para a Mesa do Senhor.

Em muitos ambientes, infelizmente, ganhou espaço a cultura da exclusão, a “cultura do descartável”. Não há lugar para o idoso, nem para o filho indesejado; não há tempo para se deter com o pobre caído à margem da estrada. Às vezes parece que, para alguns, as relações humanas sejam regidas por dois “dogmas” modernos: eficiência e pragmatismo. Queridos Bispos, sacerdotes, religiosos e também vocês, seminaristas, que se preparam para o ministério, tenham a coragem de ir contra a corrente. Não renunciemos a este dom de Deus: a única família dos seus filhos. O encontro e o acolhimento de todos, a solidariedade e a fraternidade são os elementos que tornam a nossa civilização verdadeiramente humana.

Temos de ser servidores da comunhão e da cultura do encontro. Permitam-me dizer: deveríamos ser quase obsessivos neste aspecto! Não queremos ser presunçosos, impondo as “nossas verdades”. O que nos guia é a certeza humilde e feliz de quem foi encontrado, alcançado e transformado pela Verdade que é Cristo, e não pode deixar de anunciá-la (cf. Lc 24, 13-35).

Mais tarde, no Teatro Municipal do Rio, o Santo Padre reforçou, ainda mais, a ideia da “cultura do encontro”, dirigindo-se à Classe Dirigente do Brasil (na íntegra aqui):

É importante, antes de tudo, valorizar a originalidade dinâmica que caracteriza a cultura brasileira, com a sua extraordinária capacidade para integrar elementos diversos. (...)

O futuro exige de nós uma visão humanista da economia e uma política que realize cada vez mais e melhor a participação das pessoas, evitando elitismos e erradicando a pobreza. Que ninguém fique privado do necessário, e que a todos sejam asseguradas dignidade, fraternidade e solidariedade: esta é a via a seguir. (...)

Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo. (...)

A única maneira para uma pessoa, uma família, uma sociedade crescer, a única maneira para fazer avançar a vida dos povos é a cultura do encontro; uma cultura segundo a qual todos têm algo de bom para dar, e todos podem receber em troca algo de bom. O outro tem sempre algo para nos dar, desde que saibamos nos aproximar dele com uma atitude aberta e disponível, sem preconceitos. Só assim pode crescer o bom entendimento entre as culturas e as religiões, a estima de umas pelas outras, livre de suposições gratuitas e no respeito pelos direitos de cada uma. Hoje, ou se aposta na cultura do encontro, ou todos perdem; percorrer a estrada justa torna o caminho fecundo e seguro. (...)

A fraternidade entre os homens e a colaboração para construir uma sociedade mais justa não constituem uma utopia, mas são o resultado de um esforço harmônico de todos em favor do bem comum.

Só nos resta ouvir com atenção, passar adiante, sem nunca deixar de pôr em prática...

26 de julho de 2013

VI estação da Via Sacra JMJ Rio2013

Está acontecendo, neste exato momento, a Via Sacra com os jovens, acompanhados pelo Papa Francisco. Durante esta tarde acompanhei a programação da TV Canção Nova e um dos entrevistados foi o padre Joãozinho (João Carlos Almeida, scj), que admitiu ter sido um dos autores das meditaçãoes da Via Sacra, junto com o padre Zezinho (José Fernandes de Oliveira, scj). Disse ele, entre outras coisas, que divulgaria no seu blog (aqui) os textos, no tempo real, ao serem pronunciados na celebração. Tal procedimento teria sido tomado, devido um "segredo", pedido pelos organizadores da JMJ. O padre não sabia, talvez, que todos os textos da Via Sacra (e muito mais) já foram publicados pelo site do Vaticano (aqui - é um arquivo em pdf). O que chamou a minha atenção, foi a diferença entre os textos da VI Estação ("Verônica enxuga o rosto de Jesus"). O padre Joãozinho divulga no seu blog a seguinte meditação (aqui):

6ª ESTAÇÃO - Verônica enxuga o rosto de Jesus
(Is 53, 2-3)
A mulher que não se calou
Meditação (CONSAGRADA QUE LUTA PELA VIDA):
Senhor Jesus, Cristo Redentor, eis-me aqui! Sou consagrada ao teu divino Coração no serviço ao meu irmão. Não posso me calar quando encontro nas vias-sacras da vida tantas vítimas de uma “cultura de morte”: mulheres prostituídas e famílias na miséria, enfermos sem atendimento e idosos desprezados, migrantes sem terra e jovens desempregados. Ao enxugar as lágrimas, o suor e o sangue do rosto destes irmãos e irmãs vejo maravilhada que a tua face fica estampada no lenço da minha solidariedade (Cf. Mt 25,31-46).

O texto publicado pelo Vaticano (e, se prestei atenção, também lido há pouco na praia de Copacabana), diz (aqui - p. 89):

ESTAÇÃO - Verônica enxuga o rosto de Jesus

A mulher que não se calou.
Tinha um rosto de homem do povo.
Tinha marcas de luto e de dor.
Tanto sofreu que de escarros e sangue se desfigurou.
Mas alguém o seu rosto enxugou.

Meditação:

Senhor Jesus, Cristo Redentor, eis-me aqui! Sou consagrada ao teu divino Coração no serviço ao meu irmão. Não posso me calar quando encontro nas vias-sacras da vida tantas vítimas de uma « cultura de morte »: mulheres prostituídas e famílias na miséria, enfermos sem atendimento e idosos desprezados, migrantes sem terra e jovens desempregados, pessoas excluídas da cultura digital e minorias tratadas com preconceito... a lista é grande, meu Senhor. Ao enxugar as lágrimas, o suor e o sangue do rosto destes irmãos e irmãs vejo maravilhada que a tua face fica estampada no lenço da minha solidariedade (Cf. Mt 25, 31-46). Ensina-me a sempre unir mística e militância, fé e vida, céu e terra, porque o Pai é nosso e somos irmãos, mas o pão também é nosso e somos cristãos, ou seja, gente que acredita no milagre de repartir.

Será um caso de censura? Ou de autocensura?

25 de julho de 2013

Andorinha é indispensável



Acabo de chegar do 1° Encontro de Relatos e Experiências: "O JOVEM HOMOSSEXUAL NA IGREJA", promovido pelo Grupo Diversidade Católica, no contexto da Jornada Mundial da Juventude Rio 2013. É impossível descrever tudo em poucas palavras. A primeira coisa que me vem à mente é uma cena do filme "Karate Kid", em que o mestre Sr. Han leva o garoto Dre a um monastério Shaolin, subindo as longas escadas. Ao entrarem numa das salas do templo o Sr. Han lhe apresenta uma mesa de pedra, com a fonte de água jorrando por dentro dela e diz: ''Essa é a água mágica do Kung Fu, se você beber dela, nada pode te derrotar''. Mais detalhadamente, é o jeito de beber aquela água, mergulhando a cara inteira, que me vem à mente, ao tentar resumir as minhas sensações, depois do encontro de hoje. A realidade é tão profunda e rica que seriam necessárias horas e mais horas, para poder conversar mais e compartilhar relatos e experiências com maior atenção. Sou - muito provavelmente - um sonhador obstinado, mas logo imaginei as próximas JMJ, com esse Encontro, incluído em sua programação oficial. Impossível? Algum tempo atrás, a visão de uma mulher de calça, também considerava-se impossível. Sim, passou pela fase de ser um escândalo (de origem diabólica), até chegar a ser algo considerado, simplesmente, normal. Tudo bem, o processo da aceitação de um "mundo GLBTS" na Igreja (e vice-versa) é muito mais complexo e demorado, mas a dinâmica é a mesma. Sobre essa dinâmica conversei com um dos participantes do encontro, já no caminho para o lanche. Fiquei com o desejo de muitos outros encontros desse tipo. Foi ótimo rencontrar "velhos" amigos e amigas e, finalmente, ver alguns outros que, conhecidos em uma dimensão virtual, tornaram-se reais.

Dizem que uma andorinha não faz verão. Talvez não o faça, mas é indispensável!

Parabéns, Diversidade Católica e todos que estiveram presentes! Obrigado!